A vida no transporte público em tempos de pandemia

Com medo e sem apoio, o manauara faz o “enfrentamento” à pandemia tendo que romper com as recomendações sanitárias estabelecidas.

LABF5
5 min readJul 5, 2021

Por Juliana Lira e Railson Marreiros, especial para o LabF5

A cada 100 brasileiros ocupados, 86 trabalham presencialmente em meio à pandemia. Foto: Camila Barbosa.

Evitar aglomeração e enfrentar a superlotação do transporte público. Este é o dilema que o povo manauara tem enfrentado durante a pandemia da Covid-19. A OMS e os veículos de comunicação no Brasil alertaram sobre a importância do distanciamento social como medida mais importante e eficaz para reduzir o avanço da pandemia, a campanha “fique em casa” foi disseminada por todo o Brasil, com o intuito de salvar o máximo de vidas.

Uma pequena parte da população pôde aderir às recomendações sem muitas dificuldades, podendo trabalhar de casa. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a cada 100 brasileiros ocupados, 86 trabalham presencialmente em meio à pandemia. Uma grande parcela das pessoas, principalmente os mais pobres, tiveram que escolher entre se proteger do vírus e encarar as ruas para levar seu sustento para casa.

Muitos manauaras precisaram continuar a trabalhar, embora o medo de se contaminar fosse constante. A estagiária Luciana Mendes diz que em seu trabalho não teve a possibilidade de home office, e mesmo durante o pico mais alto da pandemia, necessitou usar o transporte coletivo “Na maioria das vezes alguns ônibus continuavam super lotados o que fazia com que a distância não fosse respeitada, mesmo usando a máscara e com as luvas, afinal, todo mundo pega nos ferros dos ônibus e acaba se prejudicando” afirma Luciana.

O caso é o mesmo com a diarista Aldeide Oliveira que diz se sentir insegura ao ter que usar o transporte coletivo durante a pandemia

“Tenho muito medo de me contaminar, ainda mais por ter diabetes e estar dentro do grupo de risco, mas ganho por diária e não pude parar de trabalhar”

Durante a pandemia, uma série de protocolos foram criados para a prevenção do coronavírus. O médico clínico geral e intensivista Boris Eddy diz que o mais importante é a prevenção, evitar sair sem uso de máscara e principalmente evitar as aglomerações.

Tem faltado na história da cidade investimento públicos na consolidação de sistemas compatíveis com a capital. Foto: Camila Barbosa

Além da crise econômica, Manaus viveu uma crise humanitária agravada pela falta de iniciativa do poder público e pela desorganização dos transportes urbanos. Segundo Geraldo Alves, professor de geografia e especialista em mobilidade urbana, os problemas dos transportes públicos e das vias urbanas não são particularidades de Manaus, outras capitais brasileiras também enfrentam, tem faltado na história da cidade investimento públicos na consolidação de sistemas compatíveis com a capital, cidades bem menores Brasil afora em termos de população, já contam com sistema de BRT com canaletas exclusivas, o que representa ganho em termos de agilidade na prestação do serviço com repercussão direta no custo operacional do sistema.

“Na cidade de Manaus não foram feitos os investimentos necessários, nós temos um sistema de transporte, fraco, serviço de transporte pouco satisfatória

RISCO PARA OS TRABALHADORES E USÚARIOS

“Tenho um sentimento de desconhecimento das autoridades e governantes porque fomos esquecidos” diz o motorista Everaldo Souza.

“Ao longo da pandemia, as empresas tomaram medidas visando a não aglomeração nos coletivos. Para isso, o ministério público e a prefeitura disponibilizaram todos os carros para atender a população, mesmo no período em que houve severas restrições das atividades econômicas”. Apesar desta afirmação de Fernando Borges, assessor jurídico do SINETRAM, dados apontam que durante o pico mais alto da pandemia a frota estava reduzida para 60%.

De acordo com Elcio Campos secretário do Sindicato dos Rodoviários, a frota foi reduzida, o que acabou gerando mais aglomeração

“Sempre cobramos a utilização da frota completa e aplicação da vacina nos trabalhadores. Perdemos cerca de 80 trabalhadores e muitos pegaram Covid-19”.

Motorista Everaldo Souza fala sobre o sentimento de esquecimento pelo poder público durante a pandemia. Foto: Railson Marreiros

O motorista Everaldo Souza afirma: “Na pandemia eles tiraram os veículos de circulação. Por exemplo, na linha em que trabalho tinha seis coletivos, mas passou a operar com apenas três. No início, havia poucos passageiros, mas um tempo depois, três ônibus se tornaram insuficientes e lotavam demais. É um risco para as nossas vidas”.

Em viagens de mais de três horas o risco é maior para os motoristas e cobradores que passam mais tempo expostos a uma situação de superlotação no transporte coletivo.

REPENSANDO O TRANSPORTE COLETIVO

Em entrevista ao portal agência câmara de notícias o professor da Universidade de São Paulo (USP) Mauro Zilbovicius afirma que muitas prefeituras reduziram as frotas, favorecendo as empresas a reduzirem seus custos e gerando mais aglomeração. Com a pandemia da Covid-19 e o colapso que ocorreu na saúde em Manaus os problemas com o transporte público ficaram ainda mais evidentes, é necessário se pensar com urgência formas de melhorar este problema. O professor alerta sobre os perigos da diminuição das frotas de ônibus nas cidades e sugere que a frota seja recomposta em 100%. Analisa a importância do remanejo dos ônibus de acordo com as linhas onde estão sendo verificadas as maiores aglomerações.

De acordo com o professor Geraldo Alves uma solução a curto prazo para a mobilidade urbana em Manaus seria passar a fazer maior estímulo ao uso da bicicleta com campanhas educativas, com a delimitação de ciclovias, ciclo faixas, dessa forma se protege quem está pedalando, além disso oferecer bicicletas, de custos mais baixos, para o uso cotidiano, como alternativa de deslocamento urbano. Essa forma de deslocamento é positiva em vários aspectos, proporciona qualidade de vida para quem está pedalando, e promove o distanciamento social nesse momento em que há está necessidade.

Confira abaixo o vídeo da reportagem:

Confira abaixo também o podcast da matéria no Souncloud:

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O LabF5 publica conteúdo desenvolvido por estudantes do curso de Jornalismo da Ufam e colaboradores. E-mail: contato.labF5@gmail.com